segunda-feira, 20 de dezembro de 2010


Deambulo pelos bosques selvagens, que outrora foram meus.
Foram meus quando acreditava na pureza das árvores e das águas cristalinas que por aqui correm,
Enquanto não corrompi o corpo e a alma com pensamentos.

Fui, então, banida por esta minha arrogância semelhante à de Ícaro,
De não querer ser igual aos demais,
(tristes subordinados)
De não querer crescer a não esperar mais que a chuva ou o sol,
De querer senti-los, tê-los para mim…
De ter dado a mão a Apolo e atravessado os céus,
De caberem nas minhas mãos os dias e as noites,
Da inveja dos outros por terem as mãos demasiado pequenas para me agarrarem a mim.
E da inveja dessas árvores, que não têm mãos.
E quem me convence que não voo mais alto?
E porque me querem no chão?
E porque querem que eu sonhe os vossos sonhos?
Esse bosque selvagem onde viveis,
Foi meu já em tempos distantes,
Foi o ventre que me deu à luz,
Foi o ventre de onde fugi e me escondo,
Pois quando me sentei ao meu lado e me permiti a pensar…
Percebi que nada, à minha volta, era meu…
E, como Ícaro caio, e mergulho na aversão que a minha origem me tem.
Porque é nas minhas mãos que cabe o Mundo que vocês não sabem agarrar!


«Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?»
A.C

Rita Oliveira
20.12.2010

sábado, 20 de novembro de 2010

História de uma Rosa

Rosa… tenho pena de ti.
Nem o teu destino trazes nas mãos,
Estás perdida e cansada,
tuas pétalas vermelhas foram no vento.
Não conheces casa nem cama,
procuras, incessante, alguém que te ama,
mas murchas na impaciência de quem não sabe esperar.
E cresces assim na rua,
na berma da estrada empoeirada,
num jardim,
ou onde um dia alguém te quis semear.
Feres as mãos de quem te colhe.
(será inveja de não poder amar?)
Apaixona-me a tua inocência…
Rebentas no sonho de um Mundo melhor,
na esperança,
na vida.
Mas esse destino tão fatal de nascer da Terra,
como dos rios morrerem nos mares,
torna-te demasiado pura para os demais.
E por isso desinteressante. Inútil.
Nasces.
Cresces.
Vives da paixão.
Porém, o único amor que conheces,
é as mãos daqueles que julgam saber amar.
Oh Rosa, como vives enganada…
Estás murcha.
Trazes as folhas podres,
fedem a hipocrisia,
despem-te da pureza do colo materno que outrora foi teu. Tiraram-to!
Destroem-te a razão de crescer.
Deixam-te nua…
Morres por fim…

Rita Oliveira
30/10/2010



segunda-feira, 11 de outubro de 2010



Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Álvaro de Campos



Talvez, só talvez…
Talvez, quando o tiquetaque dos relógios estiver em sintonia e fizer coro com os sons do mundo…
Talvez, quando o despertar do ser humano for unânime…

Talvez, quando o levantar das águas tocar nas almas das gentes perdidas…
Talvez, quando o pensamento dos Homens deixar de cheirar a mofo…
Talvez, quando não trouxermos as mãos criadoras sujas de lodo…
Talvez, quando as amarras do Sentir deixarem de sufocar o meu coração…
Sim, talvez, só talvez, um dia eu regresse…
Até lá, resta-me apenas viver igual a todos, igual a nenhuns.
Viverei, portanto, como intrusa na massa informe, escura e fria.
Adormecida no Silêncio e na utopia inocente de um mundo de cor, de luz e de Razão…
Enrolada na teia da inveja de todos aqueles que amam a alma e não o corpo que a faz prisioneira…
Não existo…
Ainda não nasci…
Mas sim, talvez um dia…

Rita Oliveira
11.10.2010

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Palavras


Nunca te falarei do abismo que se insiste em meter debaixo dos meus pés.

Nunca te direi quem sou.
Inventa-me tu.
Diz-me tu quem sou eu.
Não te vou dizer que preciso de ti... para ser eu.
Não te direi nunca que no meu peito trago o botão de rosa que os teus lábios fazem desabrochar.
Não te vou revelar que, à despedida, desejo secretamente que o teu cheiro se entranhe na minha pele e me envolva até ao teu regresso.
Anda menino, vamos juntos ouvir as canções do Mundo… deixar as almas gritarem e fundirem-se numa só!
Não temas a dor que se verte na tua cara, engolir-te-ei as lágrimas para que não sofras.
Por isso, não te percas já.
Não desistas já.
Ainda não te amei o suficiente.
E não sei se algum dia amarei…

Não me interessa o que te trouxe, nem os pecados dessa tua outra vida, da que tiveste antes de mim.
Reinventa-te comigo.
Nasce comigo.
Guardarei o teu olhar na certeza de que tenho o teu coração.
Irei saber de cor cada pedacinho do teu corpo e respeitá-lo-ei como se fosse meu!
E irei guardar os teus lábios na paixão que tenho por ti.

Daqui a anos seremos apenas uma história…
Daqui a décadas vagas memórias…
Daqui a séculos já não vamos existir para ninguém…
Por isso, enquanto é tempo, pousa a tua mão na minha e escreve comigo um futuro. Completa-me aqui…
Não prometo amar-te até ao fim da tua vida, sabes que não o posso fazer… mas juro amar-te o mais que puder, enquanto o Sol e as Estrelas brilharem para mim…
Porém, nunca to direi…
Da minha boca nunca sairão tais palavras…
Vou guarda-las nos meus lugares mais profundos… para que possas tu sentir o prazer das descobrir.

Rita Oliveira
23.08.2010

domingo, 20 de junho de 2010

Desabafos



Não quero parecer insensível, muito menos áspera nas palavras, especialmente por, paralelamente ao tema principal, ir tocar em certos pontos dignos de respeito de alguém que se preze de ser pessoa.
Mas agora formalidades à parte e sinceridade em mãos!
É do conhecimento de todos que, dia 18 de Junho, Portugal sofreu uma grande perda, e quando digo isto não falo apenas do facto de termos de subtrair o número um ao número total de habitantes do Pais! Não! Portugal, no dia 18 de Junho de 2010 sofreu uma grande perda intelectual e cultural.
Direi isto de uma forma mais simples: José Saramago faleceu. José Saramago, homem de ideias individuais e próprias, com aquilo a que se chama a verdadeira coragem de pensar sem limites, faleceu dia 18 de Junho de 2010 e deixou, em páginas, em palavras, em momentos, que hão-de estar bem guardados dentro de quem leu os seus livros, a partilha dessas mesmas ideias e pensamentos.
Já entenderam a ideia? Ainda não?
Então vou expôr o problema de uma outra forma: Não desesperem caros amantes da verdadeira leitura! Nada está perdido! Ainda cá temos, e de boa saúde, a Fátima Lopes e a Margarida Rebelo Pinto com os seus Pequenos Grandes Amores e Diários da Ausência de um sujeito qualquer, a tratar de questões que desenvolvem o cérebro a passo de caracol, que nos torna mais ricos em vocabulário vazio e são óptimos para levar para a praia! Entenderam agora do que falo?

Em quase todos os canais vi pequenas reportagens feitas no velório de José Saramago e, com muita pena minha, não consegui assistir a tamanho degredo, a minha sensibilidade não mo permitia…

Ora, um certo canal nacional muito simpático fez questão de marcar presença no funeral do escritor, destacando uma jornalista, não menos simpática, para dar a honra aos telespectadores de assistirem, no conforto dos seus sofás, ao seu discurso extremamente coerente, correcto e suficientemente suspeito ao ponto de que, qualquer Segurança decente que ali estivesse, a convidaria, de certo, a soprar no balão.
Era a senhora jornalista a trocar o nome do falecido escritor com o nome do primeiro-ministro, e com o nome do grande ditador português e eram as simpáticas pessoas no velório que nunca tinham lido nada de José Saramago, que não tinham nada de José Saramago em casa a ganhar pó nas estantes, e que, quando lhes perguntavam o que estavam ali a fazer, nada mais se ouvia, e peço desculpa pela ironia, que um silêncio de morte.

É isto que me faz bater no peito e gritar bem alto que tenho gosto em ser portuguesa: é o povo que aparece só para ser visto, mal de que já se queixava Eça de Queirós, e é a senhora jornalista na televisão que em menos de meia hora tem a coragem de matar José Sócrates e a proeza de ressuscitar Salazar e matá-lo outra vez no minuto seguir (mas pronto, José Sócrates, Salazar, José Saramago… qualquer pessoa normal se enganava naquelas circunstâncias).

Digo agora, sem qualquer ironia e sarcasmo, que tenho orgulho em ter nascido a tempo de presenciar algumas das etapas da vida literária de José Saramago, de conhecer os seus pensamentos, de puder tirar proveito da sua intelectualidade para, de certa forma, enriquecer a minha, de saber o quanto as suas palavras são marcantes e eternas.
José Saramago fez história… pena que tenha sido num país que não o merece…

Se um Homem não é amado e respeitado em vida, também não o será na morte…

Rita Oliveira
20.06.2010

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Não há mais nada para dizer!



Descia a rua estreita e empoeirada,
Uma mão vinha cheia de tudo…
A outra cheia de nada…

Vinha com o seu vestido branco, não de cor, mas de pó,
Cruzava o olhar de menina com a gente da rua
Que vendia boatos e mexericos,
De que aquela menina de olhos bonitos,
Trazia a alma nua.

E era a rua estreita, pequena e cheia de gente,
E era o homem sentado na calçada…
Numa mão apertava o cigarro,
Que a poeira da rua abafava;
Atrás das costas, escondia o copo,
Que com a mágoa lhe afogava
O olhar vazio e resignado,
De quem se cansou de lutar contra a fatalidade do fado.

E ela, menina, música naquele cenário agreste,
Vinha pela rua com o seu jeito campestre.
De olhos postos no chão,
Perdida em risos que não eram os seus,
perdida na força de quem a magoa.
Oh menina, eu sei…
Que se tivesses um Deus
Sairias de ti para ser qualquer outra pessoa.

Mas não tens! E sabes…
Que nos teus olhos já não há milagres!
E sabes, apesar de não quereres…
Que ontem fomos crianças,
E hoje acordámos mulheres.

E sabes que o homem na calçada,
Ria para ti se um sorriso lhe davas.
Mas muita gargalhada também trás engano.
Corre o boato de que não és feliz
E que o teu sorriso não é dos imortais.
Mas por muito que se esconda o copo,
Quando cai o pano, somos todos iguais!

Sabes que a tua rua é estreita,
Sabes que a tua rua é pequena...

...sabes que a tua rua não tem fim.

E não há mais nada para dizer!


Rita Oliveira
24/05/2010

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Disseram-me que(...)

Um dia, alguém me disse que o Melhor Da Vida São As Coisas Simples...
Ontem, isso parecia-me vago, distante e apenas poético...




Entretanto, muita chuva caiu,
muita vida se perdeu,
muitas lágrimas se deitaram,
muitas quedas se deram,
muita conquista se fez...









E Hoje sei... que o Melhor Da Vida São As Coisas Simples! :)




Rita Oliveira



quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Óh Senhor Deus!...



Peço desculpa, antes de tudo, pela forma leviana com que a ti me dirijo.
Peço desculpa pela forma rude, se assim a considerares, com que te toco, pois não é de todo minha intenção faltar-te ao respeito.
Mas é que há coisas que incomodam a minha alma, me provocam insónias e cada vez mais ganham vida no meio das sombras ao escurecer e esperam pela noite para me atacar sem qualquer piedade.
No primeiro dia disseste: «Faça-se luz!». E a luz apareceu.
No segundo dia criaste o céu e a água…
No terceiro dia fizeste o elemento árido, chamaste-lhe terra e assim criaste as plantas.
No quarto dia inventaste as estrelas, separas-te o dia da noite, o Outono da Primavera, a Primavera do Verão e o Verão do Inverno.
No quinto dia crias-te os pássaros e os peixes.
No sexto dia fizeste os outros animais e, por último, crias-te o Homem e disseste que este se havia de se voltar para ti…

Óh Senhor Deus, no fim de seis dias de trabalho, que acredito que foi árduo, que te fez ser merecedor de tanto mérito, no fim de provares que és possuidor de tamanha criatividade e puder, confesso que foi uma desilusão saber que no sétimo dia paraste, descansaste e contemplaste a tua brilhante criação.
Paraste, descansaste, contemplaste. Não o devias ter feito, em vez disso, devias ter inventado coisas como a protecção, a igualdade, a generosidade, a compaixão… amor…

Fizeste luz, no entanto, deixas o Mundo às escuras.
Há dias em que o céu é demasiado pequeno para mim… e a água não é suficiente para me matar a sede.
Há dias em que a terra me foge dos pés e as flores morrem nas minhas mãos.
Há dias em que não há estrelas no céu para iluminar o meu caminho e em que um frio interior me invade em plena Primavera.
Há dias em que o cantar dos pássaros não chega aos meus ouvidos…
E o Homem não se pode voltar para ti porque tu não te voltas para o Homem.

Não foram poucas as vezes que me deixei estar sentada no rebato, perdida de mim, à procura dos pedaços da minha alma, que me foram arrancados por alguém, e a deixar que o buraco negro dentro do meu peito me fosse engolindo aos poucos.
E onde estavas tu?
Não foram poucas as vezes que, sentada no rebato, esperei que viesses encher-me o peito dessa Fé de que todos falam. Hoje, porém, despida daquela inocência que não falta a uma criança, sei que não era por ti que esperava, mas sim pela protecção, pela esperança e pelo carinho, que tive de aprender a criar dentro de mim, porque tu passaste o sétimo dia a descansar, a contemplar, e não tiveste tempo para puder inventar estas coisas.

Óh Senhor Deus, um dia disseram-me que aos teus olhos somos todos iguais. No entanto, isso não foi, não é, nem nunca será verdade!
E onde estás tu?

Estás entre nós, mas não estás no meio de ninguém.
Fizeste um Mundo com meios e sem princípios…
E onde estás tu?

Falo para ti. Questiono-te. Respondes-me?
Não!
Deves estar ainda a contemplar a tua brilhante criação.
Se pudesse, convidar-te-ia a vê-la mais de perto, a juntares-te a ela, tenho a certeza que a criação brilhante perderia o brilho e que dela não te irias sem uma lágrima deitar.


Rita Oliveira
03/02/2010
Dedicado à Ana e às aulas de Geografia que passamos juntas x)