Corredor(a vida corre!)

Era grande chato e comprido. E nele apenas caminhava uma criança inocente (que de criança só tinha mesmo a inocência) e uma criada velha que estava encarregue de levar a miúda até ao local desejado.
De pulso firme a criada agarrava a pequenita pelo ombro. Criança de poucas falas e de muita timidez mas nunca de má- educação!
A pequena sabia-o, ela sabia porque estava a caminhar naquele corredor, e sabia para onde a levavam.
Parecia não ter fim, aquela “estrada”.
Havia porta dos dois os lados.
Quando era ainda mais miúda, enroscava-se nos lençóis e fechava os olhos, á espera que alguma coisa sai-se de baixo da sua cama ou de dentro do seu guarda-roupa. Mas nunca saiu nada! E o medo foi desaparecendo e tudo teve um fim quando num momento de coragem abriu as portas do guarda-roupa e viu que não estava nada lá dentro... apenas ar.
Com o passar do tempo foi aprendendo que na vida há sempre portas por abrir, e ao serem abertas não se descobrem monstros, mas sim mais portas á espera de serem abertas, e assim percorre-se um caminho(como um corredor, talvez), temos de ser nós a escolher as portas que queremos abrir, porque é de nós que depende a vida, há sempre portas que ficam fechadas e nunca se abrem, há outras que têm mesmo de ficar fechadas e prova disso era o Senhor Joaquim que nunca foi muito dado a estas filosofias, gostava de assustar toda a gente do parque e ninguém lhe fazia frente.
“Fazes mal em não ter medo de mim! Sabias?” disse-lhe o Senhor Joaquim com a cara muito próxima da dela. E pronto, o problema estava resolvido, foi fácil entender que enquanto a boca dizia” Todo o mudo tem de ter medo de mim”, os olhos gritavam “Todo o Mundo tem de ter medo de mim, porque eu tenho medo do Mudo todo!”.
Talvez tenha sido uma porta que devia de ter sido aberta, e não foi, por medo se calhar. Mas uma vez admitido este facto foi fácil criar laços entre idoso e criança.
Mas ela estava ali agora, a seguir um caminho que não era o dela.
A vida sempre fora chata e uma porcaria, por ser sempre o mesmo, porque gritar, discutir, a constante violação do seu espaço era já uma espécie de regime diário, com o tempo tudo ficou monótono, ficou tudo muito igual e não havia nada que marcasse a diferença.Mas ela fazia toda a diferença.
Tinham chegado á porta desejada. Os pensamentos e recordações foram parar a uma gaveta bem fechada.
Ela tinha de abrir uma porta que não tinha de ser aberta, pelo menos, não por ela.
A criada olhou para a pequenita pela primeira vez.
Haviam ainda tantas perguntas e nenhuma resposta.
Devia de ter uns dois ou três anos quando se atreveu a perguntar “O Sol está no céu porque? Morreu?”, mas não tardou muito para alguns começarem a rir, outros não acharam assim tanta piada “ Que pergunta parva, estúpida, vê lá se quando abrires a boca outra vez dizes alguma coisa de jeito para variar!”
“O que é que tinha feito de mal?”.
“Porque falam assim?”.
“Afinal o Sol está no céu porquê?”.
Não paravam de rir.
Com dois ou três anos uma criança no mundo jurou a si própria que nunca mais ia abrir a boca para perguntar o que quer que seja. Havia de conseguir encontar respostas sozinha! Mesmo que as portas lhe fossem trancadas.
Entrou! Sentou-se á frente de um homem, que nunca levantou os olhos para olhar para ela.
Entrou! Sentou-se á frente de um homem, que nunca levantou os olhos para olhar para ela.
“Como te chamas?”
“Qual é o teu nome?”
O silêncio.
A voz infantil a dizer o seu nome, as lágrimas que caíam pela sua cara de menina, o medo de se tornar “prisioneira” de uma vida feita por outros, e a dor que teve de sentir para entender que atrás de uma porta encontra-se algo mais que outra porta, encontra-se algo que é doce e amargo, algo que nos faz rir e chorar, que dá a dor mas também a alegria, e que não era ela que devia estar ali!
Que é preciso penar para aprender;
Que viver não é apenas existir;
Que é preciso procurar aquilo que aumenta o coração.
Quem quiser saber como é que ela o aprendeu:
“Foi só caminhar no corredor, chegar ao fim, e abrir a porta!”.
Rita Oliveira
20-03-2008